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A saída para a crise da democracia representativa. Todo poder emana do povo! Plebiscito, Eleições Ge

Mandato de Injunção pela Democracia Direta

Substrato

A crise política que eclodiu em junho de 2013 continua tal e qual. À época se sugeriu um plebiscito pelo qual os cidadãos seriam chamados para decidir sobre questões pontuais, em uma reforma superficial e limitada. Não foi adiante e atualmente a saída posta não é apenas ineficiente, mas ilegítima.

Querer derrubar um governo eleito por irregularidades administrativas, que nem se consegue provar dolo, por malabarismos contábeis é imaginar uma candura em nossa política tão risível quanto ilusória. Sem qualquer prova de crime grave, restou discutir a demora em pagamentos de repasses feitos por bancos públicos e forçar o entendimento de que isso seria um empréstimo, o que proibido pela lei de responsabilidade fiscal, para esgarçar de vez o raciocínio e afirmar que isso seria um atentado à Constituição como um todo. Como se todo o sistema jurídico-político fosse ameaçado por decretos suplementares e atrasos em contrato de prestação de serviço. Se essa é a medida máxima, a mais grave das ilegalidades, suficiente para conceder ao Legislativo a competência para decidir a expulsão de um presidente eleito, não deveríamos ter sequer quórum para a votação.

A complexidade de nosso cenário político tende a fazer com que todos os problemas sejam confundidos entre si. Enquanto nos confundimos, agendas bem definidas seguem seu rumo. Não faz parte da discussão desta discussão de impeachment as poucas virtudes e muitos defeitos do atual governo. A questão é mais uma vez sobre legitimidade (ou ausência de); esse elemento comum que liga os fatos de 2013 aos presentes. O que há é uma ruptura estrutural, sistêmica. Uma percepção de que, independentemente de quem componha o governo, os resultados obtidos serão inevitavelmente moldados por interesses egoístas, daqueles capazes de manejar ao seu favor a máquina estatal.

Imaginar que uma empresa doe milhões sem que espere qualquer contrapartida é esquecer a própria razão de sua existência, lucro. Extinguir o financiamento privado ou empresarial de campanhas políticas pode retirar uma via direta de se comprar benefícios, mas não impede a atuação nas coxias do poder nem retira sua força de convencimento dos detentores do poder.

É exatamente neste ponto que se deve focar esforços independentemente dos resultados deste domingo 17 de abril. Enquanto mantida a concentração de poder em poucos, estará mantido o ambiente propício para corrupção, para o loteamento de cargos públicos, para golpes.

O caminho mais efetivo é exatamente aquele que se conclamava em 2013 e hoje se expressa pela insatisfação generalizada de uma classe média contra todos os matizes políticos, ainda que dividida em um maniqueísmo violento e, de forma ainda mais evidente, na contundente abstenção da população pobre nas manifestações atuais.

O ponto a ser enfrentado é de participação política direta.

Uma argumentação jurídica

Para além de qualquer análise política, o que se pretende apresentar é uma linha jurídica para a reforma que se entende necessária e um caminho possível para defendê-la. Essa pretensão se debruça sobre um fundamento elementar da nossa República – a efetiva titularidade do poder político; um direito constitucional que o concretiza – os instrumentos denominados plebiscito, referendo e iniciativa popular de lei; e os normativos infraconstitucionais que tentam lhes regulamentar.

Princípio Fundamental do Estado Democrático de Direito

O artigo 1º, em seu parágrafo único, diz o óbvio, que tanto e repetidamente se ignora.

Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição.

Essa afirmação categórica, absoluta, declara logo no início de nossa Constituição quem é a competência máxima, a maior autoridade para definir todo e qualquer ato que diga respeito à sociedade e ao Estado. É o povo.

Percebe-se pela leitura dos artigos subsequentes que a Constituição entende por povo o indivíduo com capacidade política. Mais ainda. Deixa claro algo fundamental. O povo age por seus representantes eleitos, mas, também, de forma direta.

Agir por representação pressupõe a escolha de alguém a quem se invista de poderes suficientes para representar. Agir diretamente não pressupõe ninguém mais além do detentor do poder em si.

Direito Constitucional

A capacidade política que permite o exercício deste poder é definida no capítulo IV da Constituição e é no artigo 14 que são apresentados os instrumentos pelos quais o povo exerce seu poder de forma direta.

A soberania popular será exercida pelo sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, com valor igual para todos, e, nos termos da lei, mediante:

I - plebiscito;

II - referendo;

III - iniciativa popular.

Novamente, há a inclusão do artigo aditivo “e” para elencar as formas pelas quais se exerce a soberania popular, da onde se consegue perceber que não é somente pelo voto que se age politicamente, mas, também, pelos instrumentos chamados: plebiscito, referendo, iniciativa popular.

Plebiscito e Referendo

A Constituição não define o conceito de tais instrumentos. Buscando a ajuda de Norberto Bobbio para compreender do que se trata o plebiscito e o referendo se observa uma característica indiscutível e primordial destes – serem instrumentos de democracia direta.

O plebiscito é, pois, uma votação popular sobre assuntos de relevância constitucional, sendo, por isso, um instrumento de democracia direta, se bem que, como todos os dispositivos deste tipo, possa ser instrumentalmente usado por correntes autoritárias ou totalitárias para legitimar o seu poder autocrático. (Norberto Bobbio, Nicola Matteucci e Gianfranco Pasquino. Dicionário de Política Vol. 1. 11ª edição. Editora UnB. p. 927).

O Referendum é tido como o principal instrumento de democracia direta, já que, por meio deste instituto, o povo, ou, mais exatamente, o corpo eleitoral, participa, por via consultiva ou deliberativa, do processo decisório. É natural, portanto, que o destino do Referendum tenha estado estreitamente ligado às vicissitudes da democracia direta. (Norberto Bobbio, Nicola Matteucci e Gianfranco Pasquino. Dicionário de Política Vol. 1. 11ª edição. Editora UnB. p. 1074).

Iniciativa Popular

A iniciativa popular se circunscreve na capacidade da população de apresentar um projeto de lei sem que dependa da atuação de um parlamentar. Trata-se de outro instrumento de ação democrática direta. Norberto Bobbio mais uma vez esclarece o intuito de tal instrumento:

Entendeu-se assim atribuir ao povo a possibilidade de manifestar as suas exigências no Parlamento, livre da influência dos partidos e dos grupos de pressão, segundo um procedimento de formação do ato de proposta que não apresenta demasiadas dificuldades. (Norberto Bobbio, Nicola Matteucci e Gianfranco Pasquino. Dicionário de Política Vol. 1. 11ª edição. Editora UnB. p. 999-1000).

A regulamentação destes instrumentos consta da lei nº 9.709, de 18 de novembro de 1998. Ao ler o conceito dado aos instrumentos e, ainda pior, o procedimento definido para a concretização dos mesmos, aqui se acredita que o que foi regulamentado por esta lei é qualquer outra coisa que não os instrumentos listados pela Constituição como capazes de permitir a atuação política direta.

Normativos Infraconstitucionais

O artigo 2º da lei nº 9.709 define como plebiscito e referendo consultas formuladas ao povo. Formuladas não pelo povo em si, mas por seus representantes.

Plebiscito e referendo são consultas formuladas ao povo para que delibere sobre matéria de acentuada relevância, de natureza constitucional, legislativa ou administrativa.

§ 1o O plebiscito é convocado com anterioridade a ato legislativo ou administrativo, cabendo ao povo, pelo voto, aprovar ou denegar o que lhe tenha sido submetido.

§ 2o O referendo é convocado com posterioridade a ato legislativo ou administrativo, cumprindo ao povo a respectiva ratificação ou rejeição.

A lei, desta forma, quando regulamentar um direito constitucional de atuação política direta, um direito este que busca concretizar a máxima fundante do Estado Democrático de Direito de que todo o poder emana do povo, não regulamentou a mais importante, primordial questão deste direito. Não foi criada a condição para que o detentor do poder, ele próprio, convoque este procedimento.

A ausência desta regulamentação deixou o direito condicionado à vontade de terceiros. Não é o povo que tem o instrumento para efetivar sua capacidade de escolher quando agirá diretamente. São somente seus representantes que lhe tem os instrumentos necessários para a deflagração deste procedimento. Representantes estes que foram eleitos exatamente para dar vazão a uma forma outra de ação política, a ação indireta.

Esta ausência não só acaba por restringir um direito constitucional estruturante do próprio Estado Democrático de Direito, mas deturba o próprio sentido deste instrumento. Ora, se o povo depende de um chamamento que só pode ser feito por parlamentares, não há poder de ação política direta. Não há possibilidade de escolha da população em qual momento ela exercerá diretamente seu poder. O poder, que segundo a Constituição emana do povo e que por ele pode ser exercida diretamente, é condicionada pela vontade não do povo, mas de seus representantes.

Para além do absurdo contrassenso, esta escolha restrita aos parlamentares é machada pelo vício da suspeição. É óbvio que o parlamentar é visceralmente interessado na decisão de quando ele poderá agir por força de seu mandato (democracia indireta) ou será o povo que agirá sem sua representação (democracia direta).

A ausência de regulamentação que conceda este elemento fundamental do direito de plebiscito e referendo (o direito a efetivar o direito propriamente dito) é, pois, inconstitucional – seja pela deturpação da lógica destes instrumentos de democracia direta, seja porque restringe e condiciona na prática um direito constitucional.

Um caminho possível

Porém não é suficiente apenas emendar a lei para que se conceda ao povo a capacidade fática de convocação deste processo. Esta forma de regulamentação seria a mesma que a existente no instrumento de iniciativa popular de lei, constante do artigo 13 e que, comprovadamente, é insuficiente para a máxima, efetiva, concretização do direito.

Art. 13. A iniciativa popular consiste na apresentação de projeto de lei à Câmara dos Deputados, subscrito por, no mínimo, um por cento do eleitorado nacional, distribuído pelo menos por cinco Estados, com não menos de três décimos por cento dos eleitores de cada um deles.

A burocracia exigida é outra forma de restrição do direito constitucional, mas restrição ainda assim. É de tal forma complexa e dificultosa cumprir com as condições da iniciativa popular que o direito fica restrito a instituições estruturadas, como sindicatos de empregados ou patronais, ou outras associações de porte e estruturadas em torno de interesses específicos. Ao povo, cidadão não institucionalizado, não é dado as devidas ferramentas.

Não basta a criação abstrata do direito, compete ao Estado por meio do direito criar as efetivas condições para a sua máxima efetivação.

Buscar conceder representatividade tanto à iniciativa popular como a uma futura regulamentação dos direitos de plebiscito e referendo é imperativo. De fato o que se busca é dar respaldo a interesses não somente individuais, mas que contemplem um interesse de maior abrangência.

É neste ponto que se deve voltar a atenção a outras ferramentas existentes, que tem o condão de estruturar e permitir esta efetividade desejada (e dever do Estado). Com o advento da internet, a sociedade conheceu uma forma bem mais abrangente de articulação. A criação de mecanismos digitais de articulação e atuação é o caminho mais direto e facilitado para se alcançar quóruns mínimos necessários para a instauração destes procedimentos.

É imprescindível que a estrutura atual seja adequada a uma nova forma, um espaço comunicativo e produtivo, desburocratizado e informativo, para que o processo legislativo receba os influxos, demandas e propostas populares diretamente. A tecnologia hoje existente nos permite a real atuação direta, uma democracia direta digital, que se desenvolve em uma rede sensível, um espaço de manifestação e ação constantes, que deve ser capaz de incorporar ao sistema político as revoltas, demandas e insatisfações populares.

Importância da atuação jurisdicional

Esta demanda não deve ser renegada a nenhum outro ator que não ao indivíduo que sofre com a ausência de uma regulamentação que lhe efetivamente conceda instrumentos de atuação política direta.

Deve ser permitida aos indivíduos a busca jurisdicional para a solução desta falha sistêmica, sob o risco de sermos todos público desta iminente quebra institucional de nosso Estado, que morrerá se não for capaz de ser alimentado diretamente pelos interesses verdadeiramente coletivos, e não de grupos econômicos.

Cabe ao indivíduo a reclamação deste direito ao Poder Judiciário, já que a questão mesma é o isolamento do Poder Legislativo e Executivo nas tomadas de decisão. Não pode ser deixado somente à boa vontade dos detentores fáticos do poder de criarem os instrumentos necessários para que eles mesmos sejam limitados, assim que desejar o efetivo detentor do poder. Não há uma regulamentação concreta que permita a ação direta por relapso, senão por mais um interesse egoísta.

Deve o Supremo Tribunal Federal, valendo-se de sua jurisprudência (MI-AgR 304 DF: “o mandado de injunção será cabível, por ter sido insuficiente a regulamentação feita pela lei”), acolher um Mandado de Injunção por estarem presentes as condições do artigo 5º, inciso LXXI.

conceder-se-á mandado de injunção sempre que a falta de norma regulamentadora torne inviável o exercício dos direitos e liberdades constitucionais e das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania;

Mesmo que existente a lei que pretende regulamentar o artigo 14 da Constituição, não há regulamentação de um gatilho direto e incondicionado a nenhum outro interesse ou atuação que não popular de deflagração do processo de plebiscito e referendo. Também não há uma efetiva regulamentação do direito de iniciativa popular, porque ausentes instrumentos que permitam e facilitem fáticamente a concretização deste direito.

Ainda se valendo de suas recentes jurisprudências (Mandado de Injunção nº 607/ES), não bastará declarar a omissão ou ausência de regulamentação pelos mesmos óbvios motivos que exigem a atuação do Poder Judiciário. Não serão os parlamentares aqueles que agirão para restringirem seu poder.

Deve o Supremo Tribunal Federal, portanto, respeitar seu dever de defensor e cumpridor da Constituição e determinar de pronto uma estrutura digital de ação direta, para que não persista a inconcebível ausência de instrumentos de efetivação de um direito estruturante e primeiro de nosso Estado Democrático de Direito.

Compete, ainda, definir os elementos basilares deste sistema, para uma eventual e futura ação atuação legislativa sobre o assunto a saber: a utilização de ferramentas e tecnologias digitais capazes de permitir uma atuação direta e não intermediada, respeitando-se a necessidade de se existirem quórum mínimos para a convocação popular de plebiscito, referendo ou iniciativa popular.

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Chamamos publicamente os advogados e a sociedade civil (independente e de livre associação) que conosco queiram adensar essa discussão visando a iniciativa de interpelação de Mandato de Injunção junto STF:

A aprovada dessa ação jurídica de iniciativa popular o STF mandaria que se institui-se os dispositivos constitucionais que permitiríamos sair da crise via deliberação soberana da população brasileira:

Resumidamente, o sistema funcionaria assim:

1. Atingido o número necessário de assinaturas seria obrigatória a convocação do plebiscito sobre o tema. Por exemplo você gostaria que tivéssemos eleições gerais? Sim ou Não.

2. Proclamado o resultado do plebiscito, o encaminhamento, ai sim passaria aos ritos constitucionais para ser redigido sob técnica jurídico-legislativa.

3. O Projeto de Lei (ou o parecer negativo) sobre a proposta retornaria para que seja referendado pelo povo.

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